UM POUCO DE
HISTÓRIA
1 - Enquadramento da situação política nacional da época (1895 - 1898)
Em 26 de
Setembro de 1895, por Decreto de Hintz Ribeiro, 1º ministro pelo Partido
Regenerador Monárquico, foi suprimido o concelho de Marvão e anexado ao de
Castelo de Vide.
Para além de
Marvão, foram suprimidos, simultaneamente, no distrito de Portalegre, os
concelhos de Gavião, Sousel e Monforte. Pelo que a supressão do concelho de
Marvão não deve ser vista como um caso isolado, mas fruto de uma política
centralista seguida pelo Partido Regenerador, então no poder.
Mas esta visão
centralista, não era apenas dos Regeneradores, já que, também o outro Partido
da alternância, o Partido Progressista, concordava. José Luciano, chefe desse
partido, afirmava em 1892: “… o Poder
Local só servia para gastar impostos e contrair dívidas, são um embaraço e
perigo para o futuro e que o melhor era fundir” (onde é que eu já ouvi
isto?).
No entanto, a
nível Regional, outros dirigentes Progressistas, como Frederico Laranjo em
Portalegre, não pensavam assim, e dizia que isso era politica dos
Regeneradores: “… que decepavam liceus, suprimiam
distritos, extinguiam concelhos e que os povos se deviam revoltar!”
2 - Situação Política Local da Época
Em Marvão em
1895, a então Vereação Camarária, era conectada com o Partido Progressista,
presidida por António Matos de Magalhães, que tinha como vice-presidente Manuel
Rodrigues Pinheiro, e os vereadores José Maria Forte, José Serra Júnior e
Francisco Rosado.
Dos documentos
que nos chegaram até hoje, esta vereação reuniu pela última vez em 5 de
Setembro de 1895, portanto antes da supressão do concelho, para decidir sobre
um assunto que nada tinha a ver com este problema - Escolher uma representação
ao Rei, para que permitisse a entrada de pão vindo de Espanha, em ano de fome.
Até 24 de Janeiro de 1898, data em que se processou a desanexação do concelho a Castelo de Vide, através de decreto do governo central, não são conhecidos quaisquer actos ou iniciativas, que manifestassem por parte dos dirigentes, ou restante população de Marvão, qualquer contrariedade ou revolta, contra a “integração centralista” em Castelo de Vide. Um pouco estranho, não?
De facto, se em
Marvão, não são conhecidos quaisquer actos nesses dois anos (1895-1897), que
revelem que a integração no concelho de Castelo de Vide, tenha sido alvo de
resistências ou insurreições por parte dos marvanenses, sobretudo por parte dos
seus dirigentes, a quem, certamente, competia liderar essas reações, já o mesmo
se não pode dizer em relação aos “integradores
castelovidenses”, que esfregaram as mãos de contentes, por verem o seu
pobre concelho passar de 3ª para “2ª classe”, à custa dos marvanenses.
Assim, em Acta da Câmara Municipal de Castelo de Vide de 1 de Outubro de 1895, uma semana depois da data de integração, o seu Presidente Pinto Sequeira da Costa (Regenerador), afirmava:
“… sendo classificado em
segunda ordem o concelho de Castelo de Vide, anexando-lhe o de Marvão, e
resultando d’ esse facto, um grande melhoramento que a todo este município deve
satisfazer, entendi convidar os meus colegas, para uma sessão solene e especial
para comemorarmos este acontecimento e significarmos o nosso reconhecimento a
todos os que contribuíram para tão grande benefício…”.
Propôs ainda Sequeira da Costa, que a vereação agradecesse ao Ministro do Reino e ao Governador Civil de Portalegre
“… que
muito cooperara para conseguir que o concelho fosse elevado a 2ª ordem.” .
Nessa mesma
reunião, o vereador Sequeira pronunciou-se também sobre o acontecido, mostrando
igual satisfação, e disponibilizou-se para organizar todas as manifestações
públicas relativas ao acto (não se sabe se os marvanenses, sobretudo os seus
dirigentes, foram convidados como “animadores” das festividades!!!).
Já no fim dessa reunião, tomou a palavra o Administrador do concelho, Joaquim Fiusa Guião, que afirmou:
“… associar-se ao justo
contentamento da câmara, e agradecia como delegado do Poder Central, as
manifestações endereçadas ao governo e ao magistrado distrital”.
De realçar ainda, que na acta da reunião seguinte, o Secretário do Município de Castelo de Vide afirmou que de acordo com o as orientações:
“… se tinha deslocado à vila de Marvão onde tinha recebido, das mãos de Luís Pinto de Sousa Júnior, Secretário da extinta câmara, o respectivo arquivo”.
Acrescentando também,
“…
que a transição se efectuara na melhor ordem e sossego e que isso ficava
lançado em acta, para que a todos os tempos ser conhecido”.
POR ONDE
ANDARIAM AQUELES QUE, NO FUTURO, SERIAM CONSIDERADOS OS "HEROIS DA RESTAURAÇÃO" DO CONCELHO DE MARVÃO?
De acordo com as
fontes que consultámos, tudo aponta, para que integração do concelho de Marvão
no de Castelo de Vide em 1895, se tenha feito de uma forma pacífica e com total
concordância de todas as partes.
Em minha opinião, se a reacção do povo nos parece normal, numa época em que a maioria dos habitantes do concelho era gente pobre e dependente de alguns proprietários agrícolas endinheirados, preocupada muito mais com a sua sobrevivência do que com questões politicas ou de poder; já muito me surpreende a reacção passiva dos dirigentes do concelho, de quem não se conhece qualquer oposição ou resistência aos factos aqui relatados. Sinal que, ou estiveram de acordo ou, como consta, terão sido aliciados pelo Partido Progressista e Frederico Laranjo, a integrarem uma vereação conjunta no município de Castelo de Vide, aquando de futuras eleições.
Durante estes dois anos em que durou a integração, muito pouco nos chegou até hoje, já que em Marvão não são conhecidos quaisquer documentos de como terá decorrido a vida no concelho durante esse período. E em Castelo de Vide, também as referências são poucas, com excepção de referências a pequenos delitos ou fuga de mancebos ao recenseamento militar.
Mas a bem da verdade histórica é bom que se saiba, que a maioria dos dirigentes autárquicos da época não eram profissionais, eram grandes proprietários da região que desempenhavam essas funções, mas que, simultaneamente, tinham poder sobre o povo, que deles dependia, e se quisessem (ou pudessem), com facilidade teriam liderado alguma revolta ou manifestação contra a integração no concelho vizinho. Ora tal, como sabemos, não terá acontecido!
Em jeito de conclusão do que descrevemos, ficam aqui as palavras de Maria Ana Bernardo, autora da obra – Centenário da Restauração do Concelho de Marvão, quando nos diz que:
“… de tudo o que se mencionou sobre o sentido das informações inclusas em documentação da administração municipal e concelhia de Castelo de Vide ressalta, por um lado, a satisfação com que os responsáveis por Castelo de Vide receberam o preceituado do decreto de 26 de Setembro de 1895; por outro, o ambiente de normalidade administrativa em que decorreu a anexação e, finalmente, a ausência de indicações sobre protestos oficiais oriundos dos antigos dirigentes de Marvão, ou sobre levantamentos populares.”
Ficamos ainda sem saber se esta integração, terá aproveitado alguma coisa aos marvanenses; já o mesmo, não se poderá dizer dos de Castelo de Vide, que em acta de 27 de Janeiro de 1898, da sua vereação, nos chegou a seguinte declaração, com que analisavam o final da anexação de Marvão:
“… esta vereação concorreu quanto pode para
assinalar as vantagens da anexação dos concelhos de Castelo de Vide e de
Marvão, agora desanexados, com grave prejuízo dos povos dos dois concelhos, que
sempre viveram na melhor harmonia e assim hão-de continuar, estreitando-se cada
vez mais as relações de família que os ligam e a comunidade de interesses
comerciais e industriais que convergem a Castelo de Vide pela sua situação e
elementos da vida. Crê que a desanexação não será duradoura, por quanto ela não
exprime a vontade geral e obedeceu apenas, às veleidades de alguns homens, que
levados de “nimio” amor pelas suas ideias sacrificaram a consciência e
legítimos interesses dos povos aos seus caprichos. Apela para os testemunhos
dos mesmos povos e eles dirão como nos dois anos que estiveram unidos
experimentaram benefícios e melhoramentos que chegaram aos lugares mais
distantes e como em tudo se revelou melhoria na administração municipal, e
d´ora em diante hão-de ver retraídos esses benefícios, principalmente nas
freguesias de Marvão onde faltam indivíduos habilitados para a necessária
rotação dos cargos públicos, e rendimentos para fazer face às despesas de
administração e aos melhoramentos privativos das localidades…”
Parece ser
sempre a mesma história os integradores ou colonizadores paternalistas, face
aos "desgraçadinhos" integrados ou colonizados…
3 - Conclusão política do autor
Como foi dito, à
data da supressão do concelho de Marvão em 1895 a Vereação de Marvão era
presidida por Matos de Magalhães, conotado com o Partido Progressista. Enquanto
a Vereação de Castelo de Vide era presidida por Sequeira da Costa, do partido
Regenerador, que por essa altura era também Governo do Reino, logo, como é
lógico, os centralistas facilitaram o sentido dessa integração.
Consta ainda
que, nessa época, o partido Progressista era liderado a nível distrital por
Frederico Laranjo, que terá prometido e convencido os “dirigentes marvanenses”
(Progressistas?) a aceitarem a integração em Castelo de Vide; com a promessa de
lhes arranjar “um tacho”, no próximo “elenco progressista” camarário de Castelo
de Vide, em futuras eleições autárquicas que se realizaram em 1896, e que os
“heróis marvanenses” aceitaram sem fazer ondas!
Só que Frederico
Laranjo nunca cumpriu a promessa, já que os Regeneradores voltaram a ganhar as
eleições de 1986 em Castelo de Vide! O que não se sabe, é se terá sido também
com o voto dos marvanenses….
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