quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Com a “saúde” não se deveria brincar...


Parece que os Cuidados de Saúde em Marvão estão de novo envoltos em polémica, a julgar por estas declarações ontem à Rádio Portalegre do Presidente da Câmara Vítor Frutuoso:

“O presidente da Câmara de Marvão acusou hoje a Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano (ULSNA) de tratar de forma “desigual e mesmo discriminatória” os utentes do concelho. Segundo Vítor Frutuoso a ULSNA “reduziu para metade” o período de atendimento dos utentes no Centro de Saúde de Marvão e em algumas Extensões de Saúde “estão a ser desmarcadas dezenas de consultas”.

O autarca referiu que estas alterações foram introduzidas de forma “unilateral” pela ULSNA, como forma de compensar a abertura do centro de saúde de Marvão em um dos dias de fim-de-semana. Responsabilizando a ULSNA pelos transtornos causados aos utentes do concelho, Vítor Frutuoso defende que os marvanenses têm direito a um atendimento semelhante ao dos outros concelhos do Alto Alentejo com a mesma dimensão.

O social-democrata observou que a forma como estão a funcionar os serviços de saúde no concelho “está longe das reivindicações” da autarquia, e acusa a ULSNA de ter agido de forma “intencional” e com base em interesses políticos.”


Que se passa afinal? Vou tentar resumir a situação.

O concelho de Marvão tem sido sempre descriminado negativamente na prestação de cuidados de saúde, quando comparado com os restantes concelhos do Norte Alentejo de igual dimensão. Para além dos seus Quadros de Pessoal terem sido sempre menores, o número de horas de atendimento aos utentes do concelho foi sempre, em média, inferior em cerca de 25 horas/semana, quando comparado com centros de saúde idênticos no distrito de Portalegre. Até há cerca de 1 mês atrás assim era, como se pode observar no Quadro 1:


A realidade do Quadro mostra que não são precisas grandes explicações ou análises, os dados são mais que elucidativos.

Há mais de 30 anos que a população do concelho de Marvão vem sendo descriminada em relação aos restantes concelhos do distrito, e cada vez que alguém por situação aguda, ou agravamento da sua doença crónica, tem necessidade de atendimento aos fins-de-semana ou depois das 5 da tarde aos dias de semana, vai de demandar para Castelo de Vide (onde muitas vezes é negado o atendimento), ou caminhar para Portalegre. Os custos são sempre por conta dos habitantes de Marvão. Até parece que pagam menos IRS que os restantes habitantes do distrito!

Uma injustiça com 30 anos.

Enquanto trabalhei e morei nesse concelho, sempre alertei, e me bati, pela reposição de tratamento igual aos outros concelhos do distrito, nomeadamente, junto dos serviços Regionais de Administração da Saúde, e junto dos representantes do Poder Local, para que defendessem os marvanenses dessa injustiça. Nunca encontrei grande eco, e fizeram quase sempre orelhas moucas, dizendo que “a saúde” não era da responsabilidade da Câmara! Aos quais eu sempre argumentei, que, ao menos, representassem os marvanenses e fizessem valer os seus direitos.

Há cerca de 5 anos, quando foi implementado este sistema de alternância de Centros de Saúde próximos, e já com esta Vereação liderada por Vítor Frutuoso, tive oportunidade de participar numa Reunião entre a Autarquia de Marvão e a Administração da ULSNA (Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano), onde foram analisados estes problemas, e onde foram reconhecidas estas desigualdades, que podemos ver no Quadro 2.


Ficou acordado que, devido à situação particular geográfica do concelho (a sede concelho ser menor que a maioria das freguesias e de difícil acesso), não fazia sentido, abrir um serviço de Horário alargado na Sede de Concelho, nomeadamente, um dia ao fim-de-semana. Mas que faria todo o sentido, que esse Horário funcionasse na Extensão de Saúde de São Salvador da Aramenha, onde se poderia, para além de servir todo o concelho de Marvão, fazer a alternância com o concelho de Castelo de Vide, a exemplo do que se faz nos outros concelhos. 

Funcionando esse serviço de Horário alargado ao Sábado em Castelo de Vide, e ao Domingo em São Salvado (Marvão).

Para que tal se verificasse, ficou a Câmara de Marvão, de realizar obras na Extensão de São Salvador, para que ali se pudessem realizar estas “consultas de Horário alargado” (não confundir com “urgências”, essas não existem em nenhum Centro de Saúde, apenas nos Serviços de Urgência de Portalegre, Elvas e Ponte de Sôr), e tanto quanto sei, essas obras, foram feitas.

Porque não se cumpriu até hoje este acordo e este Plano? Pois, não sei.

O que sei é que, recentemente, alguma alma iluminada, como existem muitas naquele concelho, resolveram andar com mais “um abaixo-assinado”, método onde se escondem aqueles que têm medo de dar a cara (e onde se escondem a maioria das vezes muitos cobardolas), a fim de exigiram à ULSNA a abertura, aos fins-de-semana, de Serviços de Saúde em Marvão. E claro, a ULSNA, fez-lhes a vontade! 

Sabe-se lá com que intenções e interesses, abriu-lhes o Centro de Saúde, não 5 horas ao fim-de-semana como havia ficado acordado há 5 anos, mas abriu-os 10 horas: 5 horas ao Sábado e 5 horas ao Domingo! Só que não foi em São Salvador, como era lógico e funcional e servir os 2 concelhos, mas na Sede Concelho, onde há mais de 30 anos toda a gente sabe que não funcionam nem funcionarão. 

Em contrapartida manteve também as 10 horas de Horário alargado em Castelo Vide. E ainda dizem que há poucos recursos humanos! A desperdiçar assim, não há recursos que cheguem. Digo eu...

Resultado: Como os Recursos Humanos não foram aumentados e os existentes não esticam, e se passaram a estar ocupados 10 horas ao fim-de-semana, passou a faltar esse mesmo tempo durante a semana. Lógico, não? Qualquer “manageiro” saberia isto, não é preciso ser doutorado em Gestão! 

Com uma agravante: é que enquanto aos dias de semana havia ocupação na prestação de cuidados familiares nas Extensões, ao fim-de-semana na Sede de Concelho ninguém lá vai. E com 10 horas bem podiam vir episódios agudos de doença... E assim, a lista de espera das consultas de Saúde Familiar começou a atrasar-se nas Extensões, e os utentes do Centro de Saúde de Marvão a saírem prejudicados. Qualquer profissional de saúde, por muito distraído que ande, saberia prever isso.

Urge portanto fazer várias perguntas, que devem ser respondidas por quem de direito:

- Porque não respeitou a ULSNA o Plano acordado há 5 anos? 5 Horas de abertura ao fim-de-semana na Extensão de Saúde de São Salvador, servindo os 2 concelhos: Marvão e Castelo de Vide. Poupavam-se assim 10 horas de equipas de saúde (Médico, Enfermeiro, Administrativo, e Auxiliar), que deveriam ser ocupadas na prestação de cuidados familiares durante a semana.

- Porque é que se abre um Serviço 10 horas ao fim-de-semana, num local de acesso difícil e ilógico, sabendo que isso, por dificuldade de parcos recursos humanos, vai prejudicar, em muito, a prestação de cuidados de saúde familiar durante a semana?

- Qual é a opinião dos responsáveis pelo Centro de Saúde de Marvão? E porque não se envolvem os profissionais para se encontrar um a solução partilhada? Ou mesmo uma pergunta mais provocatória: Quem é que manda no Centro de Saúde Marvão?

- Com este aumento de carga horária, como podem os parcos recursos médicos de Marvão, continuar a reforçar o Centro de Saúde Castelo de Vide?

- De quem é a responsabilidade de andar com “abaixo-assinados” a reivindicar coisas que deviam ser estudadas por peritos e debatendo-as primeiro? E quando não sabem porque não perguntam? Às vezes, com estas estratégias, o tiro sai pela culatra. Não me admira que venha ser o caso!

- E como irá acabar mais este imbróglio para os já, e sempre prejudicados, utentes de Marvão do SNS?

Bom senso meus senhores. Bom senso e diálogo entre quem decide e quem conhece a realidade do concelho de Marvão.

Os marvanenses têm, pelo menos, direito a um tratamento idêntico aos dos restantes habitantes do distrito de Portalegre.

   
Nota: Se alguém quando acabar de ler este Post pensar que é fácil criticar, sem apresentar alternativa e soluções, tem aqui, o que penso sobre como deveriam ser organizados os serviços de saúde em Marvão.

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