(... e eu apensar que este melro foi nosso
governante, e que esteve a um passo de ser presidente desta republica dos papagaios,
ora avaliem a sapiência e os dotes preditivos desta ave agoirenta)
As profecias
falhadas do professor Zandinga do Amaral
por Pedro Correia,
tirado daqui)
“Lembrei-me hoje bem cedo, enquanto caía o
granizo: fez agora um ano, na noite de 15 de Janeiro de 2013, surgia em nossas
casas, por cortesia da TVI, um senhor de cabelos brancos e olhos muito abertos,
assustado e assustando com palavras que soavam a dobre de finados.
Em entrevista conduzida por Judite Sousa, o professor Freitas do Amaral trocou por largos minutos a gravitas de catedrático pelo alvoroço do decifrador de conjunturas astrais, profetizando épicas pragas bíblicas sobre os frágeis ombros dos portugueses.
Em entrevista conduzida por Judite Sousa, o professor Freitas do Amaral trocou por largos minutos a gravitas de catedrático pelo alvoroço do decifrador de conjunturas astrais, profetizando épicas pragas bíblicas sobre os frágeis ombros dos portugueses.
Disse nada menos que isto:
«[Em
2013 haverá] um agravamento muito grande da espiral recessiva.»
«O
ano de 2013 só terá comparação, em dificuldades e perigo, com o de 1975.»
«A
crise do sistema político português pode pôr o poder na rua.»
«Entre
Abril e Junho/Julho, com a recessão a piorar, surgirá um tal sentimento de
indignação que força o sistema político a reagir.»
«A
hipótese mais provável é que o Presidente da República dissolva o parlamento.»
«É
inevitável que haja eleições entre Abril e Setembro.»
«O PS
tem grandes hipóteses de sair vencedor dessas eleições.»
Crédulo que sempre sou perante a doutrina
dos eminentes vultos nacionais, anotei meticulosamente numa sebenta o que o
ilustre professor entendeu proferir nessa noite memorável, bebendo-lhe a
sapiência. E à sebenta fui regressando, 2013 adiante, para aferir o grau de
acutilância de quanto fora dito em tom tão grave perante uma Judite
provavelmente tão perplexa como eu.
Fui aguardando a queda do poder na rua, a
dissolução antecipada da legislatura face à força indómita da luta popular, as
eleições antecipadas e a emergência de António José Seguro como novo condutor e
pacificador da nação. Fui aguardando o "agravamento muito grande da
espiral recessiva" e recordando aquele remoto ano de 1975, em que Portugal
esteve mais de uma vez a milímetros da guerra civil, com as armas empunhadas e
os dedos prontos a premir gatilhos.
E eis que chega Agosto: em vez da anunciada
campanha eleitoral para as legislativas antecipadas, surge nas manchetes a
inesperadíssima notícia de que Portugal saía da recessão, após dez meses
consecutivos de declínio económico. Volvidos mais uns meses, continuava o poder
sem cair na rua, contrariando o vaticínio do douto entrevistado da TVI. Em
compensação, caíam os juros da dívida, o Estado garantia antecipadamente o
financiamento para 2014 e até as famigeradas agências de notação davam sinais
de encolher as garras.
A "espiral recessiva" eclipsou-se
do discurso político e, pasme-se, até o défice das contas públicas promete
situar-se abaixo dos 5% - aquém da meta fixada por essas aves agoirentas a que
se convencionou chamar tróica. Mesmo sem dissolução do parlamento, legislativas
antecipadas e triunfo esmagador de Seguro nas urnas.
Quando o ano chegou ao fim, senti-me
aliviado: afinal o mais parecido que tivemos em 2013 com a tomada do palácio do
czar em Petrogrado foi a ruidosa confraternização entre polícias no alto das
escadarias de São Bento - algo que nem o falecido Zandinga, com os seus dons
divinatórios quase infalíveis, seria capaz de antecipar.
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