Roubado daqui, mas não posso deixar de partilhar. No meio de tanta “pobreza” ainda há humor! E quem tiver curiosidade sobre estas "personagens figurantes" pode ler parte da estória aqui.
Ai Costa, a vida costa...
O recluso aproximou-se do 44, saudou-o com
um respeitoso “Engenheiro” e uma ligeira vénia como ele gostava, e entregou-lhe
uma folha de papel dobrada. O 44 agarrou a folha e ficou a olhar para o homem
com ar desconfiado.
“Não é nada, engenheiro”, disse o homem. O
44 olhou em volta e voltou a fixar-se no colega recluso que lhe assegurou
tranquilamente: “É só para ver o que lhe andam a fazer lá fora, não é nada de
mal. É dos seus camaradas.”
O 44 abriu a folha e leu o seu conteúdo.
Olhou embasbacado para o recluso que estava à sua frente, que abanava a cabeça
com cara de caso e tornou a baixar os olhos. “Isto é uma montagem?”, perguntou,
sem levantar os olhos da folha.
“Acho que não. Pelo menos, deram-me como
bom”, respondeu o recluso.
“Há 5 anos é em 2010, pá. Que porcaria é
esta?”, rosnou o 44, fixando o outro recluso, que encolheu os ombros em
silêncio. “A mulher ficou desempregada no meu governo!”, vociferou o
engenheiro, furioso a olhar para a reprodução do cartaz. “Os gajos mandaram
isto para a rua?”
“Eu também perguntei isso”, disse o recluso.
O 44 arremelgou-lhe os olhos, “E?”
“Parece que estes são para substituir o da
tipa a virar o céu.”
“Mas que merda é esta?!”
O 44 encostou-se à parede exterior da cela.
Vários reclusos aproximaram-se. Irritado, ele levantou a folha, virou-se e, com
uma palmada, pô-la na parede. “Mas quem é que autorizou esta merda?!”, gritou.
“O Costa anda a dormir ou anda armado em sonso… ou pensa que brinca comigo?!” Os
reclusos rodearam-no para ler a folha que ele prendia contra a parede. Ele
recomeçou:
“A mulher ficou desempregada quando eu era
governo. Em 2010. Comigo ninguém ficou desempregado! Ninguém!” O 44 olhou em
volta. “Algum de vocês ficou desempregado em 2010?” Os homens negaram
prontamente com a cabeça. “Ninguém ficou desempregado em 2010! Ninguém!”, bufou
o 44.
“E, ainda por cima falta uma vírgula,
engenheiro”, disse um dos reclusos.
Temendo a reacção do 44, os que estavam
encostados ao que falara afastaram-se, deixando-o sozinho ante o olhar maníaco
do engenheiro.
“Que vírgula, pá. Falta uma vírgula onde?!”
“Aí”, o recluso deu um passo em frente e
apontou para “anos” enquanto lia alto: “Estou desempregada há 5 anos sem
qualquer subsídio ou apoio.” Fez uma pausa e explicou: “E, com esta frase, nem sei
se a vírgula era suficiente, parece-me que não. Mais valia porem: “Estou
desempregada há cinco anos e há um ano, ou dois ou o que fosse, sem qualquer
subsídio ou apoio…
E a segunda frase…”
“O que tem a segunda frase?”
“Devia ter pessoas, não é só um número, 353
mil. São 353 mil pessoas. Podiam ter posto: Somos mais de 353 000 pessoas.”
“Tem ali um asterisco no número”, indicou um
recluso.
“Um asterisco nunca é bom”, respondeu o que
estava a falar. “E depois não podem dizer, não brinquem com os números, respeitem
as pessoas quando é o cartaz que as despersonaliza…”
“Mas temos aqui um analista de
publicidade?!”, interrompeu o 44, furibundo. “Qual asterisco, quais números,
quais pessoas! Isso não interessa nada. As pessoas não interessam nada! O que
interessa é que eu há 5 anos era o primeiro-ministro e o PS era o governo.”
O 44 calou-se, amarfanhou a folha com raiva,
lançando-a numa bola para dentro da cela, levou as mãos à cabeça, que abanava
desesperado e, por fim, abrindo as mãos em prece, recomeçou:
“O PS põe um cartaz na rua com uma mulher
que se diz desempregada desde quando eu era primeiro-ministro e o PS governo,
e, ainda por cima, segundo o que a mulher diz e eles escrevem, nunca recebeu
nenhum subsídio ou apoio. Desempregada há 5 anos sem qualquer subsídio. 5 anos!
Mesmo quando nós éramos governo. Um ano e meio… Mas que merda de cartaz é
este?!... O que é isto, pá?!... O que é isto?”
Os reclusos abanavam as cabeças como os cães
de plástico com uma mola em vez do pescoço que se viam antigamente em automóveis
seleccionados.
O 44 olhou em volta, semicerrou os olhos
numa expressão maléfica e sussurrou para os reclusos: “Quem
é que tem um telemóvel?”
(Este veio daqui)
Sem comentários:
Enviar um comentário