…a meu pai (1920-2006)
Decorria o ano de 1956, já havíamos passado o solstício de verão e as noites corriam longas e cálidas, celebrando-se nesse dia, segundo o calendário gregoriano, a festa de S. Pedro. Manuel, homem de pouco mais de trinta anos de idade, caminhava ao longo das margens da ribeira, que meia dúzia de quilómetros mais abaixo, chamavam de rio Sever e que o conduziriam ao moinho do Fraguil, onde morava. Cismava sobre os últimos meses da sua vida, falando baixinho como era seu hábito, após mais uns copos com os amigos, na tasca do Xico Videira. Esperava pelas duas horas da manhã, hora que, juntamente com mais meia dúzia de companheiros, pegariam nas suas cargas de café contrabandeado que iriam entregar perto de Malpartida de Cáceres.
Luísa, sua mulher, havia-o deixado, depois de mais uma desavença entre ambos e, juntamente com a filha, haviam-se acolhido em casa arrendada na Matela, do outro lado da ribeira, cerca de mil metros de distância em linha de tiro, de onde Manuel agora se encontrava. Francisco, o filho mais velho, então com quinze anos de idade, já há muito que trabalhava em casa de patrão, para ganhar a vida, que os tempos não iam fáceis.
Várias haviam já sido as suas tentativas de ajuntamento, mas desta vez, Luísa, parecia não estar pelos ajustes. Ele bem tentava, pois todos os dias, à tardinha, esperava Conceição, assim se chamava a filha do casal desavindo, quando esta regressava da escola e lhe entregava um pãozinho, incumbindo-a de dizer à mãe, que voltasse para casa, na esperança, que tal gesto, pudesse seduzir Luísa, mas até esse dia sem qualquer resultado prático. Apesar do pão não ser devolvido, também os sinais de que Luísa estivesse para quebrar, tardavam em aparecer.
Pouco passava das dez horas da noite, hora aquela de lusco-fusco, em que todos os gatos parecem pardos e, Manuel, sentiu como que um calafrio que lhe percorreu a espinha, dorida dos trinta quilos de café que tinha carregado a noite passada e depois de mais uma fuga dos guardas-fiscais, que por pouco, o não apanhavam ali bem perto do secadeiro-da-bruxa. Mas aquele calafrio, não lhe pareceu de dor, nem tão pouco de frio, pois a noite estava quente e, as dores, sabia ele como lhe mordiam.
Demorou ainda alguns segundos a perceber o porquê, mas, no momento seguinte, a coisa ficou clara no seu pensamento, pois, certamente, se devia à lembrança de corpo de mulher, que há três meses não tocava e, que de repente lhe aflorou, algures na sua cabeça.
Sem perceber, como que por automatismo, encontrou-se a saltar as passadeiras que o levariam à outra margem da ribeira e, sem saber muito bem porquê, já subia, por entre as giestas floridas, a encosta que o haveria de levar ás proximidades da casa onde vivia Luísa…
Decorria o ano de 1956, já havíamos passado o solstício de verão e as noites corriam longas e cálidas, celebrando-se nesse dia, segundo o calendário gregoriano, a festa de S. Pedro. Manuel, homem de pouco mais de trinta anos de idade, caminhava ao longo das margens da ribeira, que meia dúzia de quilómetros mais abaixo, chamavam de rio Sever e que o conduziriam ao moinho do Fraguil, onde morava. Cismava sobre os últimos meses da sua vida, falando baixinho como era seu hábito, após mais uns copos com os amigos, na tasca do Xico Videira. Esperava pelas duas horas da manhã, hora que, juntamente com mais meia dúzia de companheiros, pegariam nas suas cargas de café contrabandeado que iriam entregar perto de Malpartida de Cáceres.
Luísa, sua mulher, havia-o deixado, depois de mais uma desavença entre ambos e, juntamente com a filha, haviam-se acolhido em casa arrendada na Matela, do outro lado da ribeira, cerca de mil metros de distância em linha de tiro, de onde Manuel agora se encontrava. Francisco, o filho mais velho, então com quinze anos de idade, já há muito que trabalhava em casa de patrão, para ganhar a vida, que os tempos não iam fáceis.
Várias haviam já sido as suas tentativas de ajuntamento, mas desta vez, Luísa, parecia não estar pelos ajustes. Ele bem tentava, pois todos os dias, à tardinha, esperava Conceição, assim se chamava a filha do casal desavindo, quando esta regressava da escola e lhe entregava um pãozinho, incumbindo-a de dizer à mãe, que voltasse para casa, na esperança, que tal gesto, pudesse seduzir Luísa, mas até esse dia sem qualquer resultado prático. Apesar do pão não ser devolvido, também os sinais de que Luísa estivesse para quebrar, tardavam em aparecer.
Pouco passava das dez horas da noite, hora aquela de lusco-fusco, em que todos os gatos parecem pardos e, Manuel, sentiu como que um calafrio que lhe percorreu a espinha, dorida dos trinta quilos de café que tinha carregado a noite passada e depois de mais uma fuga dos guardas-fiscais, que por pouco, o não apanhavam ali bem perto do secadeiro-da-bruxa. Mas aquele calafrio, não lhe pareceu de dor, nem tão pouco de frio, pois a noite estava quente e, as dores, sabia ele como lhe mordiam.
Demorou ainda alguns segundos a perceber o porquê, mas, no momento seguinte, a coisa ficou clara no seu pensamento, pois, certamente, se devia à lembrança de corpo de mulher, que há três meses não tocava e, que de repente lhe aflorou, algures na sua cabeça.
Sem perceber, como que por automatismo, encontrou-se a saltar as passadeiras que o levariam à outra margem da ribeira e, sem saber muito bem porquê, já subia, por entre as giestas floridas, a encosta que o haveria de levar ás proximidades da casa onde vivia Luísa…
6 comentários:
eh pá! não esperava já esta!
sempre fomos, os bugalhões, grandes contadores de estórias (eu nem tanto), mas não estava à espera dum parto assim (o título é 'como nasce...', não é?).
sabia desta estória por fragmentos, que o chico não gostava muito de falar sobre estas desavenças que lhe marcaram a infância. estar a ler isto leva-me a acreditar que o natal é definitivamente a festa da família. terá sido por isso que a escreveste?
não vou comentar nada. vou ficar à espera do próximo episódio. a ver se vemos nascer algo dessa premente força que um homem sente e que faz desempedernir muita cisma, adoçando o querer e produzindo decisões que, de outra forma, seriam muito difíceis de tomar.
abraço
já agora uma crítica construtiva.
como és o postador, tem atenção à escrita:
- o uso das vírgulas parece-me desajustado. não as ponhas entre o sujeito e o predicado duma frase. por exemplo a frase 'Pouco passava das dez horas da noite, hora aquela de lusco-fusco, em que todos os gatos parecem pardos e, Manuel, sentiu como que um calafrio que lhe percorreu a espinha,...', ficaria mais correcta, e mais elegante, assim 'Pouco passava das dez horas da noite, hora aquela de lusco-fusco em que todos os gatos parecem pardos, e Manuel sentiu como que um calafrio que lhe percorreu a espinha...';
- os acentos tb são importantes ('á' é incorrecto);
- não faças períodos muito longos;
- descreve com calma, deixa o leitor saborear os acontecimentos, em vez de ter que os comer à pressa;
- escreve primeiro em word, revê, pede que alguém próximo o reveja tb, para expurgar o texto de erros contraproducentes. depois é só copiar e colar; e
- leva tudo a sério, mas sem deixares o humor cáustico que herdámos de fora. disseste que no 'retórica..' não pode haver muita intelectualice, logo, ri-te e faz-nos rir.
peço-te que não leves a mal estes reparos. é a última vez que os faço em público, mas achei que seria importante, dado o teor do que aqui postaste. mas também não venhas para cá com a estória do ensino técnico e outras tretas do tempo da outra senhora. sabes fazer bem, faz.
por outro lado, vê lá no que te metes, pq a malta depois quer saber tudo. alguém um dia terá que escrever a estória do 'ti manel e da 'ti luísa, e se calhar calhou-te a ti. mas toma cuidado, não vá haver quem ache que a estás a reescrever... se é que me entendes.
parece que já 'tou a ver a tua cara de 'ah, caga nisso, isso é conversa de chacha...'... talvez seja, não sei. mas preferi dizê-lo já, quando a gravidez ainda nem começou.
terá sido nessa noite?
sentido abraço
Como nasce um blogue…ou “como nasce um escritor”?
Ao contrário do luís, eu, não conhecia a estória de nenhuma forma, o que não é de estranhar
Desde logo me ficou “um gostinho nos olhos” e, aguardo os episódios seguintes deste recém-nascido, para acompanhar a sua crescença, nesta “história de vida”
Facilmente conseguimos visualizar e/ou imaginar a agrura e beleza da paisagem; no que toca ás emoções só mesmo quem as viveu ou sentiu, de alguma forma, as conseguiria descrever
Será que foi destes “escaramuças emocionais” que nasceu “um menino”?
bjocas
Parabéns pelo parto.Só espero que a escrita não seja como a táctica futebolistica, senão estamos bem arranjados...
Força Buga!
O assunto deste blog interessa-me, e por isso, a minha pequena e humilde contribuição.
Estou em Portalegre, o dia corre monótono, as nuvens e o tédio que as acompanha, desceram pela Serra de S. Mamede de tal forma que nem eu nem o sol aquecem seja o que for.
Vou por isso, fazer um esforço para escrever algo, porque não gosto de ler nem escrever. Limito-me a sonhar, e o dia ajuda a isso.
Não vou criticar ou sugerir caminhos, no entanto, nada tenho contra quem o faz.
Como leitor passivo que sou, limito-me a ler as partes que os leitores activos transpiram e me parecem interessantes, daí, ser pouco interventivo nestas coisas modernas mas emergentes de consciências e pensamentos que são os blogs.
Tio João, parece-me que apesar de ainda embrionária, a tarefa que se propõe, para além de enriquecedora, se afigura dificil e estimulante, que o pode levar a gostos e desgostos;
E afinal, o que é a vida senão uma sucessão encadeada de gostos e desgostos, que nos permitem ir dizendo ciclicamente que, estivemos vivos, percorremos caminhos, saltámos muros, e aqui estamos presentes.
Li o que escreveu, e independentemente do sentido da estória, dos factos relatados, da forma como a escreve, com vígulas ou sem elas, o que interessa é que se divirta, se estimule, e que os leitores o queiram acompanhar e sonhar consigo, sentindo-a e acompanhando-o lado a lado.
Um abraço.
...que família esta. O Ma´rio nem sequer gosta de ler, ou escrever e vejam só. Quase rebento de orgulho!
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