Um dos maiores problemas das “urgências hospitalares” e que urge resolver com urgência
Há dias, quando da visita do ministro
da saúde ao concelho de Marvão, o presidente da Câmara, assumindo que tinha
algumas dificuldades em perceber/dominar as dinâmicas dos serviços de saúde,
pediu-me ajuda sobre algumas ideias/sugestões a apresentar ao ministro, com
vista a melhorar os cuidados de saúde aos habitantes do concelho.
Dividi esse apoio em 2 Capítulos :
1 – Um pequeno diagnóstico de situação;
2 – Algumas ideias/sugestões que elenquei para a melhoria da prestação de
cuidados, nomeadamente: o que deveriam ser as responsabilidades dos serviços de
saúde e que contributos poderia dar município.
Uma das ideias que sugeri, que parece
que agradou ao senhor ministro, verbalizando até, que era apenas a segunda vez
que lhe falavam disso, diz respeito à
forma como se vive a fase terminal da vida, morre e onde se morre em Portugal.
A minha sugestão foi a seguinte:
“Criação de um projeto piloto de prestação de cuidados de saúde com as
IPSS do concelho (sobretudo cuidados médicos), para diminuir ou evitar o
recurso constante destes utentes aos serviços de urgência hospitalar, em
situações clinicas que a maioria poderia ser resolvida no local com um pouco de
bom senso, e, consequentemente, minimizar a situação degradante do acumular de
pessoas em macas nos corredores hospitalares, a maioria em fase terminal de
vida, ou mesmo para aí morrerem, quando se houvesse um profissional médico que
assistisse estas situações, em articulação com as famílias, iria permitir
alguma humanização na fase terminal da vida e da morte, com benefícios para
todas as partes e diminuição de custos para todos.”
Quem já entrou numa urgência
hospitalar, mesmo que seja por breves instantes, não pode ficar indiferente à
quantidade macas nos corredores hospitalares, ocupadas por estas pessoas com
idades superiores a 85 e 90 anos, a
maioria das quais, pouco ou nada se pode fazer em termos de cuidados de saúde hospitalares, que ali permanecem e,
morrem, em condições desumanas, degradantes, longe dos seus familiares e do seu
leito de abrigo (seja ele em casa ou na instituição residencial), sujeitas a um encarniçamento de cuidados
médicos de exames complementares inúteis que nada resolvem, tubos evasivos em
todas as cavidades do corpo, que ocupam os profissionais de saúde da
urgência que deveriam ter o foco do seu
trabalho no que, de facto, é urgente e não na prestação de cuidados paliativos
para os quais não estão vocacionados, nem devem estar, porque não é essa a sua
função no sistema de saúde.
Foi por isso, com agrado, sinal que
há mais gente preocupada com este problema, que assisti ontem na RTP, à
divulgação de um estudo sobre a esta temática – Onde se morre em Portugal, e a sua divergência com um conjunto de
outros 32 países, como podem verificar no Gráfico em baixo:
Gráfico 1 –
Onde se morre em Portugal (2012 – 2021)
Fonte: Projeto EOL in Place
Como se pode verificar no Gráfico, em
10 anos, a divergência de Portugal em face desses países, passou de menos de
3%, (2010/2011), para 9% em 2020/2021). Com tendência para aumentar, se nada
for feito e face às últimas estratégias medicocentristas e hospitalocentricas
do SNS, e abandono dos cuidados de saúde primários (invadidos por profissionais de formação hospitalar, que nada percebem de cuidados primários de saúde), e cuidados paliativos.
Num breve exercício teórico e tendo
em conta que em 2023, em Portugal, se registaram um total de 118 864
óbitos, inferindo que as percentagens se mantêm, quer dizer que apenas
27 576 óbitos se registaram nos domicílios; enquanto 91 288 óbitos
ocorreram, certamente, nos hospitais.
Se estivéssemos ao nível das
percentagens dos 32 países referidos no estudo, possivelmente, apenas
80 590 óbitos teriam ocorrido nos hospitais; o que daria uma diferença de
cerca de 10 600 pessoas que
morreriam no seu cantinho, possivelmente junto daqueles que lhes são mais
queridos e que melhor os podem ajudar nessas horas difíceis. E quanto se pouparia em cuidados de saúde hospitalares que poderiam e
deveriam ser dirigidos para outras áreas?
Este problema urge ser encarado pelo próximo governo. Os portugueses agradecem e deveriam exigir...