sexta-feira, 25 de abril de 2008

RENDIMENTOS DO CAPITAL GENÉTICO...

(Discurso proferido no dia 25 de Abril de 2008, em representação da Assembleia Municipal de Marvão, na comemoração do dia da Liberdade. Da autoria do neto de Xico Bugalhão e José da Quinta).

Há trinta e quatro anos por esta hora, eu era um rapazinho que tinha feito dezassete anos, há apenas quinze dias. Mas que, porque assim era nesse tempo, já contava com cinco anos de trabalho como trabalhador, por conta de outrem.

No meu país havia uma guerra absurda que levava os jovens para combaterem em África durante dois e três anos, onde alguns morriam e outros ficavam desgraçados para o resto da vida.

No meu país não se podia falar sobre a vida pública, existia um partido único. Não se podia criticar os governantes, porque havia uns “senhores” que prendiam a gente, só pelo simples facto de expressarmos opinião, ou contestarmos os capatazes.

No meu país não havia água canalizada para beber, nem saneamento básico mínimo. As crianças, muitas morriam ao nascer, ou nos primeiros anos de vida e ás vezes as próprias mães para os darem à luz (ou parirem, como diz o povo).
A maioria dos portugueses só comiam carne nos dias de festa, e o leite, para alguns, só lhe conheciam o gosto, através do que bebiam das mamas de suas mães.

No dia vinte e cinco de Abril de mil novecentos e setenta e quatro, ao levantar-me, como de costume, pelas sete horas da manhã, para iniciar mais um dia de trabalho na oficina de serralharia civil onde trabalhava, ouvi na rádio a notícia que havia um grupo de militares que tinham dado início a um Golpe de Estado.
Soube mais tarde, que desse Golpe, tinha resultado um Programa de Acção, que ficou para a história como o “Programa dos três Dês”:
- Descolonizar;
- Desenvolver;
- Democratizar.

Desse dia, passam agora trinta e quatro anos e cumpriram-se, em minha opinião, dois desses três Dês.
O de Descolonizar, bem para uns, mal para outros a coisa lá se fez. Tarde…mas, não havia outro caminho.

O de Desenvolvimento, apesar dos diferentes pontos de vista, a evolução aconteceu…o país de hoje, com todos os problemas sociais e económicos que nos apoquentam, nada tem a ver com o país de setenta e quatro, do “orgulhosamente sós”. São outros os tempos!

Mas o terceiro D? O de Democratizar?
Será que podemos concluir hoje, que vivemos uma Democracia plena e que os valores e princípios democráticos estão incorporados no dia-a-dia do nosso sistema social?

Reflictamos e questionemos:

- Que raio de democracia é esta, que permite as balbúrdias constantes nas escolas com faltas de respeito e agressões dos discípulos para com os seus mestres?

- Que raio de democracia é esta, que só condena os mais fracos e deixa os poderosos escapar pelas malhas de um sistema de justiça inoperante?

- Que raio de democracia é esta, que num dia faz eleições para escolher os seus representantes e no dia seguinte, os eleitos, são derrubados pelos “barões”, em “feiras de vaidades” vergonhosas?

- Que raio de democracia é esta, que concentra todos os seus recursos no Litoral e abandona, sem solidariedade, os que vivem no interior, só porque são poucos e sem poder para influenciar?

- Que raio de democracia é esta, que permite com frequência a gestores, que um dia são públicos, no dia seguinte são privados e gestores dos negócios, que fizeram quando eram públicos?


- Que raio de democracia é esta, que permite que alguns (os mandantes), trabalhem apenas meia-dúzia de anos e se aposentem com reformas milionárias; enquanto outros, têm que trabalhar até ao dia da morte?

- Que raio de democracia é esta, que persegue os contribuintes de baixos rendimentos, para liquidarem os seu poucos proveitos; e isenta desses deveres, aqueles que têm lucros fabulosos, vivendo à “grande e à francesa”, como descendentes de Junot ou Masséna?

- Que raio de democracia é esta, que cria uma “polícia de guerra” para reprimir os usos e costumes de um povo; e fecha os olhos, à entrada de produtos dos grandes grupos económicos internacionais, alguns bem mais lesivos para a saúde pública que os nossos produtos tradicionais?

- Que raio de democracia é esta, que permite uma comunicação social, sem ética e sem regras, seja o maior poder e que comande a política de um país, trinta e quatro anos após o dia de início do sistema democrático?

Fernando Pessoa, disse um dia: Senhor, falta cumprir-se Portugal…

Também hoje, com propriedade, convém afirmar:
Minhas senhoras e meus senhores FALTA CUMPRIR O D DA DEMOCRACIA EM PORTUGAL. É URGENTE QUE O FAÇAMOS…

João Bugalhão