segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

O Bairro da Fronteira do Porto Roque – Galegos, Marvão

“Fazer de conta que se dialoga, que se é um democrata, mas fazer só o que lhe vai na real gana...”

Hesitei bastante em escrever sobre este tema, pois, possivelmente, irei desagradar a alguém para além daqueles a quem me dirijo, nomeadamente, alguns interesses particulares legítimos, mas o que penso que aqui estou a defender é o interesse público, e o concelho de Marvão. O ideal era que esses interesses particulares pudessem ser negociados e harmonizados com os interesses comunitários e, sinceramente, não me parece que seja isso que esteja a acontecer, e por isso decidi que não podia ficar calado. Pelo menos fico bem com a minha consciência, e levanto aqui uma questão, que antes de ser decidida, deveria ser alvo de uma discussão alargada entre a comunidade marvanense.

Como é do conhecimento da maioria dos marvanenses, ou deveria ser, após um longo processo, a Câmara Municipal de Marvão acabou de adquirir (com o dinheiro dos contribuintes, isto é, de todos nós), pelo valor de cerca de 700 mil euros, ao Estado Central, o complexo do Bairro da Fronteira de Galegos. Felicito aqui todo o trabalho e empenho de Vítor Frutuoso e sua equipa pela aquisição, mas não posso estar mais em desacordo com o processo que agora se está a desenvolver.

Como é reconhecido, certamente por todos os marvanenses, trata-se de um espaço nobre: amplo, agradável, plano, bem situado junto à fronteira com Espanha. E a seguir ao espaço da Portagem, talvez seja o melhor espaço do concelho. Se estivéssemos em tempo de “vacas gordas” ou se eu fosse um idealista diria que, aqui, quase tudo se poderia arquitectar. Mas como os tempos não vão de feição, e eu sou mais do realismo do que dos sonhos, sou em opinar que, perante esta localização única, se deveria parar para pensar o que ali se poderia e deveria fazer, e, não embarcar na primeira ideia que vem à cabeça (por mais iluminados que nos julguemos), na mais fácil, ou de favores a amigos de ocasião. Porque está em causa o interesse público, e uma situação destas não se repete na história do concelho.

 Apesar do Presidente Vítor Frutuoso, que não é nada teimoso (!), já ter metido na cabeça há muito tempo que a finalidade estratégica deste espaço seria para habitações – quer para alguns que já aí vivem, quer para acrescentar ao já farto parque habitacional do concelho (existem 2 apartamentos por família no concelho de Marvão); na última Reunião de Câmara de Outubro, quando da discussão do Orçamento 2015, fiquei com a ideia que se iria fazer um debate, e que a opção da zona habitacional iria passar por alguma discussão.

Mais disso fiquei convencido quando o próprio Presidente, considerou a Declaração de Voto apresentada pelo Vereador Nuno Pires: - “Que essa declaração seria, no futuro, como uma “bíblia” para o actual Executivo”. E transcrevo aqui o que dizia essa Declaração a este respeito:

- Bairro da Fronteira do Porto Roque (Maior investimento proposto para 2015)

Relativamente à aquisição deste Bairro, é com pena que verificamos a falta de estratégia por parte do executivo acerca desta infra-estrutura (talvez um dos locais mais nobres do concelho), com um potencial para desenvolvimento de Projectos da área económico e social em deficit no nosso concelho, nomeadamente, a falta de emprego e o despovoamento.
Concordamos com a aquisição, e estamos de acordo com a resolução das situações dos habitantes que efectivamente habitam estas casas; Estamos ainda de acordo, que sejam criadas as condições necessárias para a manutenção de habitação digna e condições dessas famílias, ali ou em outro local que se negoceie. Mas defendemos que após a aquisição, e tendo em conta a situação de localização de excepcionalidade deste Bairro, deveria ser criada um Comissão/Grupo de Trabalho compostas por peritos e autarcas, com vista a encontrar um Projecto que beneficiasse o concelho e os seus habitantes.  
Esta nossa visão de futuro para esta infra-estrutura vai ao encontro das declarações do presidente do Tribunal de Contas Europeu, Dr. Vítor Caldeira, proferidas na recente homenagem que lhe fez o Município na atribuição da medalha de mérito Municipal, quando declarou que: “...o desafio dos municípios do interior para combater o despovoamento, é o de encontrar alternativas?”. Estas declarações poderão bem ser o mote que se aplica a este Projecto.
Em nossa opinião, manter o foco exagerado no desenvolvimento da Habitação e Urbanismo, é um erro crasso deste executivo para o projecto da Fronteira. Temos vários exemplos ao longo destes mandatos:
 - O terreno para o Loteamento na Beirã, transformado actualmente numa pista de MotoCross;
- O Loteamento de Santo António das Areias, com mais de 50% dos lotes para vender;
- O loteamento do “Vaqueirinho”, o processo continua a aguardar resolução;
- O terreno para o Loteamento da Portagem, nada se sabe;
Num concelho que segundo os censos 2011 tem 2 apartamentos por família, a aposta continuada na habitação, talvez não seja prioritário. Seria bem mais importante virar agulhas para a requalificação do que existe.”

No entanto o que verifico nas informações dadas por Vítor Frutuoso, é que esse debate, não se irá fazer, pois ele já há muito que tomou a decisão. Veja-se o que encontrei na Acta da Reunião do dia 5 de Janeiro de 2015:

INFORMAÇÕES DO SENHOR PRESIDENTE: A Fronteira de Marvão já está na posse do município e vai tentar reunir com os moradores e saber quais são os que pagavam renda ao Património do Estado para lhes propor um ajuste directo caso desejem adquirir as casas. No entanto, vai solicitar aos advogados do município um parecer sobre a legalidade desta intenção. É para avançar com esta ideia, tendo em conta que há pessoas que não têm contratos de arrendamento, e com as quais pretende fazer o negócio directamente sem irem a hasta pública para não serem prejudicadas caso haja outros interessados nas habitações. Na reunião vai informar que irá dar preferência a quem pagou renda durante estes anos e é intenção que fique registado que as casas sejam para primeira habitação e as que sejam para férias serão colocadas em hasta pública. Depois desta reunião e depois de feita uma lista dos interessados, bem como de uma selecção dos mesmos, apresentará à Câmara Municipal.”

Conclusão:

A “bíblia” e os seus mandamentos, para Vítor Frutuoso, não passam de tábua rasa.

É pena, mas a coisa pública é assim que se administra. Assim o concelho irá gastar cerca de 2 milhões de euros (700 mil de aquisição + 1,3 milhões para infra-estruturas, no mínimo). Para aplicar numa coisa que já somos largamente excedentários, e que irá aumentar drasticamente nos próximos anos, quando concelho ficar com cerca de 2 500 habitantes, cerca de 1 000 famílias e perto de 3 000 apartamentos familiares.

As perguntas que ficam são se, este investimento não poderia ser melhor rentabilizado, beneficiar e contribuir para o desenvolvimento efectivo do concelho, nomeadamente, na criação de emprego e fixação de pessoas? Se não se deveria procurar resolver o problemas dos ainda ainda aí vivem, e ficar com o espaço livre para se planear um bom projecto. E em vez de se beneficiarem meia dúzia de pessoas, com o dinheiro de todos, não seria melhor construir um Projecto que beneficiasse muitos marvanenses? E quem serão os grandes conselheiros do Presidente, que assim decide, num tão importante projecto para o concelho, desprezando o debate e novas ideias? 

As questões aqui ficam. Veremos os resultados...      

1 comentário:

Helena Barreta disse...

lembro-me de ver, há uns anos atrás, uma reportagem telivisiva sobre esse local e o que os interessados, penso que 3 pessoas, queriam desenvolver e não era um projecto habitacional como parece ser o que agora se pretende.

Um abraço